sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

RENAMO acusa exército de traficar armas


O ministério da defesa de Moçambique nega que elementos do exército estejam a fazer tráfico de armas e comercialização de mercúrio provenientes também de armas, como acusa a RENAMO, o maior partido da oposição. A FOMICRES, ONG moçambicana que trabalha com questões ligadas a armas, valida grande parte da justificação do Ministério da Defesa, mas confirma o comércio de mercúrio no país. Entrevistei para a DW África o director da FOMICRES, Albino Forquilha, para compreender as possibilidades desta denúncia constituir verdade.


Nádia Issufo (NI): Com base no tranalho que a sua ONG faz confirma a existência de tráfico ilegal de armas?

Albino Forquilha (AF): A minha ONG tem estado muito envolvida em pesquisas sobre a proliferação de armas, e temos trabalhado também nas zonas fronteiriças, sobretudo com a África do Sul, Zimbabué, Zâmbia e Malawi, e o que lhe posso dizer é que não temos nenhuma evidencia que haja tráfico de armamento de Moçambique para fora do país. Mas temos conhecimento que tem havido moçambicanos que usam o armamento antigo vindo da União Soviética e explosivos, que suspeitam que o seu fabrico envolveu mercúrio. Tivemos casos de acidentes no país de pessoas que procuram abrir estes explosivos a procura de mercúrio para posterior venda. Mas de uma maneira institucional, a partir do exército e outras instituições que estejam ligados ao armamento, a fazerem tráfico dele para a RDC, não há evidência alguma.

NI: O exército também acusa o exército de estar a usar armas B11, a que eles chamam de armas de destruição maciça. Sabe algo em relação a isso?

AF: Há três semanas houve uma acusação da RENAMO onde diziam que o exército estava a usar armamento pesado, inclusive aviões contra as sua tropas na Serra da Gorongosa. Houve de facto muitos tiros, mas o que de facto se confirmou, e tenho elemento da minha ONG a trabalharem nestas zonas, o que se confirmou é que houve o uso de metralhadoras, armamento que não é AKM, é uma arma com mais capacidade, houve uso de RPG7, vulgarmente conhecida por bazuca, e sim uso de algum armamento como B21.
  

NI: E quais são as consequência do uso de armamento do tipo B21? O seu uso é proibido internacionalmente?

AF: O uso deste armamento não é permitido quando se trata de uma acção policial, mas estamos a falar de um assunto político-militar. O que o exército fez foi procurar dispersar os militares da RENAMO que se concentram na Serra da Gorongosa, provavelmente onde esteja o seu líder a fazer a preparação das incursões que acabam em ataques a civis e infra-estruturas sócio-económicas. O exército terá usado armamento um pouco a cima da AKM para poder fazer esta dispersão...

NI: Mas B11 não?

AF: Não tenho conhecimento de que se tenha usado B11 como tal. Também tenho conhecimento que não civis feridos.

NI: O Governo tem capacidade de supervisionar e controlar a movimentação das suas armas neste tipo de contexto?

AF: Tem a capacidade de controlar as armas sobre o seu poder, a única capacidade que está longe de ser conseguida pelo Estado moçambicano é do controlo das sua fronteiras; marítima, aérea e mesmo terrestre. Pode haver de facto entrada ilegal de algum armamento, ainda não temos capacidade, como Estado de controlar isso.


http://www.dw.de/renamo-denuncia-tráfico-de-armas-para-extrair-mercúrio/a-17465513

Comité Central da FRELIMO em polvorosa

Começou nesta quinta-feira o Comité Central da FRELIMO, o partido no poder em Moçambique. A escolha do seu candidato com vista às eleições presidenciais a acontecerem em outubro próximo é o tema polémico e em destaque. É que a Comissão Política do partido nomeou três pré-candidatos à sucessão de Armando Guebuza, a contra-gosto da chamada velha ala da FRELIMO. Ela exige que seja alargado o leque de opções. E na sequência disso várias correntes no país já dizem que a hegemonia do Presidente Armando Guebuza está em queda livre, pois os contestados pré-candidatos são vistos como seus delfins, e assim qualquer ambição de Guebuza cair por terra. E sobre o assunto que entrevistei na quarta-feira, para a DW África, Baiano Valy, jornalista e analista político moçambicano.


Nádia Issufo (NI): O que se espera deste encontro que termina no próximo domingo?

Baiano Valy (BV): Será uma sessão muito renhida, com debates muito acesos, porque há elementos que indiciam para tal constatação. Antes desta sessão, houve um encontro da Comissão Política, e, na última semana, a ACLLN, que é a associação dos antigos combatentes da FRELIMO, veio a público dizer que não se revia nesses três candidatos, afirmando que era necessário alargar o leque das possibilidades.
Por isso, acho que esse será um ponto prévio, a inclusão de mais candidatos. Penso que um outro ponto prévio será a reestruturação do atual Secretariado-Geral, em que também a ACLLN não se revê, por ele ter cometido várias falhas.

NI: Acha que as especulações sobre divergências no seio da FRELIMO podem vir a ser confirmadas de forma clara depois do Comité Central ou mesmo durante o próprio Comité?

BV: Em momentos conturbados como esses temos visto essas clivagens no seio da FRELIMO. No entanto, quando termina uma sessão do partido, principalmente quando essa sessão tem os problemas bem resolvidos, a FRELIMO aglutina-se como um todo.
Penso que durante o Comité Central essas clivagens serão bem claras. No entanto, se a questão for bem resolvida e se o candidato à Presidência for alguém que reunir o consenso da maioria dos membros do partido, a FRELIMO não fará outra coisa senão aglutinar-se e apoiar esse candidato.

NI: Uma cisão, com a saída de membros da FRELIMO para formar um outro partido, à semelhança do que já aconteceu, por exemplo, na África do Sul, é um cenário absurdo?

BV: Não estou a ver membros da FRELIMO a sair para formar um outro partido. Porque, nesse momento, quem aparece a contestar publicamente são os membros da chamada "velha guarda". E penso que, provavelmente, não terão a força suficiente para saírem do partido e criarem um outro.
Se essa contestação viesse, por exemplo, da nova geração, aí poderíamos antever uma cisão. Não podemos dizer que é, de todo, um absurdo, porque em política tudo é possível.

NI: No final do Comité Central da FRELIMO, caso sejam propostos outros nomes como pré-candidatos, acha que a imagem de Armando Guebuza pode sair prejudicada, uma vez que os atuais pré-candidatos são vistos como os seus possíveis delfins?

BV: A imagem do Presidente Guebuza já está beliscada, porque a partir da altura em que a Comissão Política aparece publicamente a dizer que havia escolhido estes pré-candidatos, foi aí que as vozes no interior da FRELIMO começaram a levantar-se.

NI: Dada esta negação em relação aos pré-candidatos propostos, acredita que o poder de Armando Guebuza no seio do partido FRELIMO está na reta final?

BV: Acredito que sim, porque a governação do Presidente Armando Guebuza foi uma governação de medo. Olhando para aquela máxima de Nicolau Maquiavel que dizia "vale mais um líder ser amado ou ser receado? Talvez seja melhor que seja receado", então Guebuza governou e inspirou esse medo no seio dos militantes da FRELIMO, tanto que alguns que apareciam a dizer que não concordavam com algumas das decisões foram colocados de lado.
Os militantes vão lá com uma missão bem clara que é: "não podemos permitir que esse senhor continue por muito tempo aos lemes dos destinos do partido."

Também disponível aqui:  http://www.dw.de/substituto-de-guebuza-é-a-polémica-por-resolver-no-comité-central-da-frelimo/a-17459925

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

João Pereira "conforma-se" com bipolarização política em Moçambique

Em Moçambique a CNE voltou a ser partidarizada, contrariando a tendência de despartidarização em curso no país. Na negociação da crise político-militar, entre o Governo da FRELIMO e a RENAMO, o maior partido da oposição, assim foi decidido. De lembrar que a CNE numa primeira fase era partidarizada, e mais recentemente composta principalmente por membros da sociedade civil, embora considerados próximos ao partido no poder. Entrevistei para a DW África João Pereira, académico da área de Ciências Políticas e Administração Pública da Universidade Eduardo Mondlane, sobre o assunto. 




Nádia Issufo (NI): O senhor não considera a nova partidarização da CNE um retrocesso ao processo de democratização?

João Pereira (JP): Eu pessoalmente acho que não. Nós estamos na construção do processo democrático, quando o nível de confiança dos atores, dos partidos e dos cidadãos em relação às decisões políticas é muito baixa. Muitas vezes, a falta desta confiança tem criado condições para potencializar este conflito. Se isto vai ajudar aos atores políticos – neste caso a RENAMO, o MDM e às outras forças políticas – a confiar mais na Comissão Nacional de Eleições e no STAE, então, à própria estabilidade do país, acho que é um risco que deve se correr.

NI: Mas não há o risco de RENAMO e FRELIMO capturarem a CNE criando uma espécie de "bipartidarismo"?

JP: Sim, mas esta é a história deste país nos últimos 10, 15 anos. Sempre foi gerido dentro da lógica da bipolarização. Então, se os eleitores dão a legitimidade à RENAMO ou à FRELIMO para representar os seus interesses, não serão organizações da sociedade civil nem a vontade externa que vai impor esta vontade interna.
O sistema político moçambicano, neste momento, é bipolarizado e é a partir da bipolarização que vai se construir as decisões democráticas. Até que se chegue a uma altura que o próprio MDM ou outra força política consiga fazer frente à esta bipolarização.








NI: E avançar com a sociedade civil, como havia sido feito anteriormente, não seria muito mais transparente e justo?

JP: Eu sou moçambicano e ando há muito tempo a procura da sociedade civil que não seja politizada. Todas as organizações da sociedade civil, direta ou indiretamente, têm seus interesses. E, muitas das vezes, quando você tem atores como, por exemplo, o partido FRELIMO, RENAMO, MDM ou outras forças políticas, que você não tem consciencia da sociedade civil, então como esta sociedade civil pode garantir a neutralidade se estes atores políticos não tem confiança nestas mesmas organizações da sociedade civil.

Então é um caso muito complexo que vai se construindo diariamente. E, se calhar daqui a 15, 20 anos, quando houver reformas profundas na sociedade, e, por outro lado, com uma classe média muito mais forte do esta que existe atualmente, talvez teremos instituições independentes. Este é um processo normal da construção e reconstrução do sistema político de Moçambique. Nós vamos ter estes momentos frquentemente pelos próximos cinco, sete, oito anos – que são momentos de avanços e recuos. Só assim que vamos construir as instituições políticas.

NI: Existem duas outras instituições notadamente partidarizadas: o Conselho Constitucional e o Exército. Com esta repartdarização da CNE, o senhor acha que não há chance de despartidarização destes outras instituições?

JP: Nos próximos tempos, vamos ter uma situação muito semelhante a outros países africanos em processo de transição. Então, isto não é muito preocupante neste momento. Temos que criar condições para que as instituições se consolidem a partir do aumento da Educação e da Cidadania das pessoas. Segundo, a partir da mudança geracional em nível dos partidos políticos.
Com esta mudança geracional, acredito que nos próximos 10, 15 anos, teremos condições suficientes de criar instituições políticas que não sejam muito capturadas pelas forças políticas – neste caso RENAMO e FRELIMO – mas que comecem a existir outros atores sociais e políticos. Por exemplo, a emergência do MDM também vai permitir a mudança do jogo político. A emergência de uma sociedade civil, de uma classe média e das academias mais fortes podem contribuir imensamente para o aumento da credibilidade e garantia de transparência e neutralidade das instituições políticas.

Escute a entrevista em:  http://www.dw.de/partidariza%C3%A7%C3%A3o-da-cne-em-mo%C3%A7ambique-n%C3%A3o-%C3%A9-retrocesso-diz-analista/a-17440922

Em STP Presidente tenta manter exército sob controlo

Uma crise militar agita São Tomé e Princípe. E para resolver isso sucessivos encontros entre o Presidente Manuel Pinto da Costa e o Conselho Superior de Defesa Nacional estão em curso. Recorde-se que a insubordinação dos militares, ao recusarem-se prestar as honras militares ao Presidente, foi a gota de água.  É que o exército queixa-se dos salários, más condições de vida e incumprimento de promessas. O facto acontece num altura em que o país vive ainda uma crise político-social e em ano de eleições. Entrevistei para a DW África o analista santomense Olivio Diogo sobre o impacto da crise militar no atual contexto.


Nádia Issufo (NI): A insubordinação pode trazer consequências negativas para o poder político?

Olívio Diogo (OD): Qualquer tipo de insubordinação vindo das forças militares ou paramilitares traz consequencias gravíssimas para o Poder Executivo. Ao longo desta semana houve vários Conselhos de Estado, quando o Presidente da República reuniu-se com os mais altos dirigentes militares. O chefe das Forças Armadas anterior já havia perdido o controle da situação. É preciso dizer que, neste momento, há uma proposta de substituição do brigadeiro e de sua equipa. Daí que vamos ver como esta nova equipa se articula com os militares.

NI: Disse que não há controle sobre os militares. Face a esta situação é possível que o Exército seja manipulado por alguma força de oposição para um golpe de Estado?

OD: Não. No meu ponto de vista não há uma manipulação por parte dos partidos de oposição para que isto aconteça. A criação do brigadeiro, a promoção do conjunto de militares, a separação do Comando Geral das Forças Armadas do Quartel General para uma outra instância foi uma criação do partido do primeiro-ministro. Eu não perceberia como este partido que havia criado esta situação conspiraria contra a seu própria obra. Este bloco que foi criado é que está sendo posto em causa pelos militares.

NI: Depois da Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe é o país africano de expressão portuguesa que mais tem golpes de Estado registados em sua história. Vê a possibilidade de uma volta a esta prática?

OD: Os golpes de Estado que acontecem em São Tomé e Príncipe são diferentes do que acontecem na Guiné-Bissau. Porque um golpe de Estado que um presidente é reconduzido ao poder é o que podemos chamar de insubordinação. Nesta altura, se me disser que há condições para que isto volte a acontecer, eu não acredito. Porque há uma parte dos militares que está descontente com a direção e esta direção está disposta a se afastar. Eu estou convencido que a situação se normalizará.

NI: Em que medida o apoio de Angola a Manuel Pinto da Costa pode intimidar possíveis ações contra ele?

OD: Pode se considerar de certa forma ingerência porque o Manuel Pinto da Costa tomou o poder ele já tinha convidadoo alguns militarse. No meu entender isto não vem a promover nada e contribue para criar mais desconfiança na população. Quando o presidente toma esta atitude com a intenção de intimidar os nossos militares, isto pode ter manifestações contrárias. Eu acho que seria um erro estratégico do Presidente Manuel Pinto da Costa recorrer aos militares estrangeiros.

NI: São Tomé e Príncipe vive uma certa tensão social político-social. Como interpreta esta situação em um ano de eleições?

OD: Os partidos políticos não estão a transmitir confiança a população. A cada dia que passa, entendem-se menos entre eles. A cada dia que passa, chama-se por uma posição mais ativa da sociedade civil porque os partidos estão perder a confiança.

Escute a entrevista em:  http://www.dw.de/militares-entregam-proposta-ao-governo-em-s%C3%A3o-tom%C3%A9-e-pr%C3%ADncipe/a-17441154

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

O branco da vida


Envelhecer precocemente é um acto de irreverência para com o próprio tempo, é desafiar os ponteiros do relógio, de forma voluntária ou não,  para uma corrida contra o tempo: quem me leva primeiro a morte, tu ou eu?  Tirando os casos de doença as vezes invejo os que se rebelam contra ele em nome de grandes prazeres- É preciso saber morrer, saber fazer do tempo seu criado, fazer dele o que quisermos, domina-lo. Escolher se queremos morrer com o pó do tempo ou o pó da vida. Entretanto, tal um como outro exigem as suas manhas quando se trata de ludibriar os ponteiros, por exemplo, a mentira tem grande utilidade para elevar a auto-estima e para manter crédulos e "fieis" os mais inocentes quando se opta pelo pó do tempo.

E passo a contar um caso:
Enquanto o meu filho mergulhava profundamente os olhos nos meus espessos cabelos eu adivinhava a pergunta seguinte, e claro acertei: "Mãe, estás a ficar velha??" Mas os meus cabelos brancos também não surgem a toa, enquanto ele se concentrava na pergunta eu me concentrava na resposta: "Não meu filho, é charme." Charme para os inocentes, mas não burros, pelo que entendi, deve equivaler a dizer: "O pai natal traz-te um tablet se não bateres os meninos na escola", pois muito desconfiado ele perguntou: "O que é charme mãe?" E eu toda empertigada com o pescoço mais alto do que uma girafa, a postura de uma gazela e o olhar de um felino respondi embrulhando-o em manto de palavras desconexas e gaguejei: "Charme é quando uma pessoa, é assim, assim... sabes, linda..." E o pequeno com o olhar mais cheio de pó do tempo do que os meus respondeu: "Mãe, está a mentir, não é?" E caímos dos dois, cúmplices, numa gargalhada boa.

Pronto, escolhi tossir o resto da vida com o pó do tempo, mas descubro a cada dia que a mentira é como um xarope para me aliviar dos escarros...




quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Suabura de quem?

Para a Cristina:

Foto: Cristina K.

O gato da casa da minha avó só era preocupação quando não aparecia para comer e estava doente. Detestava quando passava a sua cauda pelas minhas pernas a cobiçar o meu peixe e ficava debaixo da minha cadeira, mas a minha avó diz que isso significa sorte. Mas para ele significa azar, porque nunca lhe dou de comer, mas o meu avô partilhava sempre a sua comida com ele.
O gato da casa da minha avó é sortudo, pois na terra da minha avó, e do gato, e na casa dela, abunda o peixe.
Mas o gato da casa da minha avó não tem casinha especial, brinquedos, e também ele não trepa para o colo da minha avó. O gato sabe que tal acto resultaria numa dura penalização.
Na verdade são os gatos da casa da minha avó, porque desde que existo que os vejo lá, e acho que não é a custa das suas sete vidas. Os meus primos dizem que todos os gatos em Inhambane se chamam Suabura, mas até hoje não sei se é piada ou verdade. O que é verdade é que hoje percebo que tenho inveja dos gatos da casa da minha avó, pois os seus longos passeios nunca são questionados, e muito menos os seus namoros. Já quanto a mim...
Eles também  têm livre transito, são como os machistas de "gema", fazem o que querem sem que lhes cobrem satisfações. E não é porque a minha avó não sabe que eles não falam.
A minha avó nem sabe que existe pedigree, portanto todos os gatos são apenas gatos. A noção de pedigree que a minha avó tem, só pode ser aplicada aos humanos. E vista as coisas nessa perspectiva ela conheceu-a pelo lado mais fraco: cafre.

Há alguns anos apareceu na casa da minha mãe um gato. E ela deu-lhe o nome da minha avó, mas a minha avó sentiu-se insultada. Gato não pode ter nome de gente. Para a minha mãe isso era motivo de gozo, mas, claro, nunca na presença da minha avó. Um dia o gato da casa da minha mãe ficou doente e ela mandou uma das suas empregadas levá-lo ao veterinário. A empregada, que foi educada a nunca negar ordens do patrão, violou os ensinamentos e mandou a minha mãe dar uma curva. "O que vão dizer as pessoas quando me vierem com o gato na rua?? Vão se rir de mim!!!", justificou ela. A minha mãe não restou outra saída se não mandar a outra empregada que em meio a risada, embora contrariada, o fez. Cuidar de animais ou leva-los a passear é humilhante para muitos conterrâneos meus, afinal animal é animal e gente é gente, pensam muitos.

Na maioria das casas na terra da minha avó existem gatos, e lá eu nunca ouvi ninguém chama-los de "meu" gato. Porque será?