terça-feira, 23 de abril de 2013

Primeiro fim da militarizacao, depois diálogo entre RENAMO e Governo mocambicano

Em Moçambique a negociação entre a RENAMO, o maior partido da oposição, e o Governo da FRELIMO foi adiada para dia 29 de Abril, enquanto o país aguarda por um desfecho pacífico. Recorde-se que um confronto entre as duas partes teve lugar em Muxungué, no centro do país no início deste mês, resultando em 4 mortos e mais de 10 feridos. Entrevistei para a DW  Fernando Lima, jornalista e director do semanário moçambicano Savana, que considera o adiamento como estratégico. Para ele as partes estão a por termo primeiro as posições belicistas, para depois sentarem-se a mesa de negociações.  


Nádia Issufo: A imprensa local tem noticiado que o Governo moçambicano está a adquirir material bélico. A ser verdade, isso acontece por causa da tensão política que se vive no país ou estas são meras aquisições de rotina?

Fernando Lima (FL): Eu não tenho nenhuma informação sobre essas aquisições de material, especificamente para esta questão da confrontação com a RENAMO. Tenho conhecimento, sim, que há programas regulares de reequipamento das Forças Armadas e também da polícia. Isso acontece com alguma regularidade. Mas uma notícia desta natureza pode dar a entender que a polícia e o exército moçambicano estão muito bem equipados. Esta ideia não é verdadeira. É opinião corrente dos especialistas que o exército, sobretudo, mas também as forças policiais, continuam a estar deficientemente equipados para responder quer às missões de defesa da soberania, quer a missões de lei e ordem, como é o caso da polícia.

NI: E qual é a situação da RENAMO? Tem efectivos e de equipamento militar suficientes para enfrentar o exército governamental no caso de um eventual confronto?

FL: Não são conhecidos os efectivos da RENAMO e nem o seu grau de armamento. Tecnicamente, como é do conhecimento público, a RENAMO não deveria ter armas, tal como é de conhecimento que sempre teve armas.Ao longo desses anos o Governo em colaboração com o exército e a polícia sul-africanos têm desmantelado dezenas e dezenas de paióis em todo o país e que esses paióis pertenciam a RENAMO. mas nestas circunstâncias é de se prever que não tenha uma força muito bem apetrechada.

DW África: Circulam informações segundo as quais altas patentes militares do Governo se dirigem à zona centro, para além de militares. E também há informações de que se intensificam os treinos do outro lado da baía de Maputo, na Catembe. Paralelamente, há tentativas de negociações entre a RENAMO e o Governo. Como vê este paralelismo?


FL: Não estou de acordo com este cenário. Se é verdade que há treinos militares, esses treinos militares acontecem todos os dias, todas as semanas. É normal haver treinos no exército e na polícia. Também é verdade que tem havido movimentações de patentes militares e da polícia na zona centro do país. É normal que isto aconteça porque há uma situação de tensão, portanto as forças do Estado movimentam-se também nesta área. Agora, é claro que este tipo de movimentações, quer de generais, quer de posicionamento de forças no terreno, também contribuem para o aumento da tensão.

NI: Enquanto isso, a negociação foi adiada para o dia 29 de Abril. Face a este adiamento, pode-se dizer que há realmente interesse em resolver este caso que deixa muitos moçambicanos preocupados?

FL: Eu acho que, de parte a parte, ninguém quer perder a face. E, portanto, por exemplo, a desmilitarização do centro do país não pode acontecer para já, por via dos comunicados públicos. Portanto, quer-me parecer que isto vai acontecer. As partes vão verificar esta situação e pretende-se que se chegue à mesa das conversações com um melhor ambiente, sobretudo do ponto de vista táctico-militar. Uma das exigências da RENAMO é, sobretudo, que seja, de algum modo, eliminada a presença da Força de Intervenção Rápida da polícia na zona centro do país. Quer-me parecer a mim que não vai haver nenhum comunicado oficial do lado do Governo a dizer que isto está a acontecer a pedido da RENAMO. Por outro lado, houve claramente uma concessão, creio que no sentido correto, de afastar os encontros de um restaurante, porque claramente a FRELIMO e o Governo querem minimizar o tipo de contactos que mantêm com a RENAMO. Mas, por outro lado, a RENAMO também tinha pedido para que o ministro da Agricultura, José Pacheco, fosse afastado das conversações e ele mantém-se como chefe da delegação governamental.
Este adiamento aparente visa exatamente encaixar estas cedências de parte a parte num melhor ambiente para que tenham lugar novas conversações entre a RENAMO e o Governo.

NI: A actuação da RENAMO em resposta a actuação da polícia em Muxungué terá dado vigor ou contribuído para que este partido recuperasse alguma credibilidade, ou terá desencadeado o efeito contrário? Isso se considerarmos as reivindicações do cumprimento dos Acordos de paz de 1992...

FL: Há uma situação de escalada de tensão e respondeu da forma que melhor está preparada para responder, ou seja, não responder politicamente, mas pela via da violência. Surpreendentemente em termos da opinião pública moçambicana a resposta da RENAMO não teve como resultado uma condenação explícita e direccionada a RENAMO. A condenação foi contra a violência provocada pelos ambos os lados do conflito e uma pressão muito grande para que as partes parem a violência e que encontrem soluções e que as duas partes não voltem a guerra. Portanto, do meu ponto de vista a RENAMO não foi explicitamente condenada pelo facto de ter respondido a violência por parte da policia moçambicana.  

Escute a entrevista em:  http://www.dw.de/moçambique-está-sob-tensão-à-espera-de-diálogo-político/a-16765760

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