terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Eleições na UA: um grande espelho

Na hora das eleições nunca houve união, graças a Deus! Também na União Africana falta união quanto a pessoa que deve dirigir a Comissão da organização. Jean Ping, o presidente em exercício, quer continuar no cargo. Nos últimos meses fez uma "campanha eleitoral" na África Ocidental, mas ao que tudo indica de nada lhe valeu. A sul-africana Nkosazana Dlamini-Zuma parece estar no bom caminho. 

Esta luta, para além da saudavel falta de união, mais uma vez evidencia as fragilidades da maioria das organizações regionais do continente africano. O gabonês fez sozinho a sua campanha, não houve nenhuma campanha institucional. Refiro-me, por exemplo, a organzição regional a que ele ou o país dele pertence, ou outra qualquer que o quisesse apoiar. Já no caso da sul-africana a SADC assumiu que Dlamini-Zuma é a candidata apoiada pela África Austral e ponto final! A CEDEAO prefere dividir-se, "ingleses" de um lado, e "franceses" de outro. 

Mas existe bom senso na União Africana, e ao que tudo indica Jean Ping vai continuar a liderar a Comissão da União Africana atá Junho, e ai provavelmente a Dlamini-Zuma assuma o cargo. Esta solução, não prevista pelos estatutos da organização, é consensual. Assim, o queniano Erastus Menchwa, vice-apresidente da Comissão, já não vai ocupar o cargo até Junho, altura em que novas eleições devem acontecer, como prevêm os estatutos da UA. 
No meio disso tudo, o nome de Joaquim Chissano já é apontado como o candidato forte da SADC para substituir a sul-africana...

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

A entrada de Manuel Vicente para a cena política

O presidente de Angola anunciou hoje mudanças no seu executivo. Uma das novidades é a re-criação do cargo de ministro de Estado da Coordenação Económica, a ser ocupado por Manuel Vicente, ex-responsável da empresa Sonangol. Também José Eduardo dos Santos anunciou a formalização do funcionamento do Fundo Petrolífero. Segundo a presidência um dos objectivos destas remodelações é reduzir a concentração de tarefas. Entretanto, estas mudanças acontecem pouco tempo antes das eleições no país. Falei, através da DW, com o enconomista angolano Justino Pinto de Andrade sobre as remodelações e comecei por lhe perguntar se o cargo de Ministro do Estado da Coordenação Económica não se sobrepõe ao cargo do ministro da economia:


JPA: Não sei como as coisas vão funcionar, porque quando foi extinto o cargo de ministro de estado para a coordenação económica, logo de seguida criou-se o cargo de ministro da economia. É óbvio que do ponto de vista da hierarquia um ministro da economia não tem a mesma relevância que um ministro de Estado. Com este novo cargo seguramente haverá um re-arranjo ao nível da economia, eu acredito até que haja uma extinção do ministério da economia e que alguns ministérios ficarão tutelados ou vinculados ao ministro de Estado para a coordenação económica. E um desses ministérios será seguramente o das finanças. Eu julgo também que haverá alguma suburdinação a este novo ministro de alguns ministérios que tem a ver com as infra-estruturas.

NI: Será por acaso o novo ministro uma espécie de acessor directo do presidente angolano para questões internas e até externas?
JPA: Penso que o presidente José Eduardo dos Santos ao criar nesta altura, a sete meses das eleições, este cargo, ele quer por a rodar uma figura que tem sido muito falada nos últimos tempos. Uma das acusações feita a essa pessoa é de não ter experiência governativa, embora tenha experiência de gestão empresarial. E se facto eu estiver certo, essa pessoa será colocada como ministro do Estado.

NI: Quem é essa figura?
JPA: Eu acredito que seja o engenheiro Manuel Vicente, o PCA  da Sonangol.

NI: O crescente investimento angolano em Portugal, nomeadamente nos bancos, pode ser interpretado como uma tentativa de  Luanda usar Lisboa como uma porta de entrada para o mercado europeu?
JPA: Eu não vejo a coisa bem assim, porque nós não temos muita coisa para exportar para o mercado europeu para além daquilo que exportamos actualmente, o petróleo. E este produto é vendido com ou sem participação dos bancos portugueses. Eu penso mais na ideia de agilizar os gestores angolanos num mercado mais fácil de ser gerido, que é o mercado português para eventualmente transformar esta plataforma para outros voos mais arrojados. É evidente que com esta participação nos bancos portugueses podemos aumentar a nossa capacidade de mobilização de recursos para financiar empreendimentos em Angola.

NI: Também o presidnete angolano formalizou o Fundo Petrolífero. Como vê esta instituição no contexto das polémicas sobre a gestão dos recursos petrolíferos?
JPA: Espero que este recurso petrolífero seja um fundo do Estado e que não se transforme num fundo mais ou menos privado e gerido ao gosto daqueles que dominam o poder. Estes fundos, do meu ponto de vista, para fazerem algum sentido, devem ter um controle institucional.

Para ouvir esta entrevista clique em:
http://www.dw-world.de/dw/0,,9585,00.html
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quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

ICG: Guiné-Bissau tem grandes desafios, apesar dos bons sinais

A "International Crisis Group" diz que o caminho que a Guiné-Bissau está trilhar agora é encorajador, apesar de considerar que os graves problemas do país ainda persistem. Num documento intitulado "Para além dos compromissos: Expectativas de reformas na Guiné-Bissau" esta ONG, voltada à resolução e prevenção de conflitos armados, deixa algumas recomedações a Bissau. Numa entrevista a DW, cinduzida por mim, o analista para a Guiné-Bissau desta organização, Vincent Foucher, começou da segunite forma:

VF: A situação na Guiné-Bissau é complexa, primeiro sinal é a aliança entre políticos e militares durante os atentados de 26 de dezembro. Isto mostra que o poder civil aumenta o controle e isto também se deve ao grande apoio da comunidade internacional, e particularmente de Angola. Mas quando se olha para os recentes acontecimentos percebe-se que a situação é preocupante. No país ainda se faz tráfico de droga, houve o assassinato do presidente e a força da impunidade por parte dos militares continua intacta.

Nádia Issufo: O que tem a dizer sobre o apoio que Angola está a dar a Guiné-Bissau?
VF: Penso que a presença angolana é muito importante para ajudar o primeiro ministro e o seu governo na reforma das forças armadas. Mas a estabilidade resultante do apoio angolano deve contribuir para combater a impunidade, o tráfico de droga e o nepotismo. Penso que angola deve constribuir para combater isso. Angola tem de ser capaz de dialogar com outros doadores para uma informação e coordenação transparente, isso é muito importante.

NI: Carlos Gomes Júnior tem o apoio de Angola, dos militares e agora anunciou que se vai candidatar as eleições presidenciais de Março próximo. Como vê o percurso dele?
VF: Penso que ele tem uma mão forte, ele é um homem de negócio e tem o apoio de Angola. Em termos de apoio internacional ele e outros grandes intervenientes e tem ligações com chefes de organizações, mas também tem inimigos ou pessoas que não confiam nele. Mas ele conseguiu também coisas boas para o país, como por exemplo a nível económico."

NI: Existem assuntos graves não resolvidos no país como a morte do presidente Nino Viera e de um destacado militar e ainda o tráfico de drogas, supostamente feito com a conivência de gente ligada ao poder. É possível construir-se uma nova Guiné-Bissau por cima deste contexto?
VF: Penso que é um problema. Por exemplo, ter de lutar contra a impunidade dos dirigentes de topo das forças armdas. Isto tem sido um dos graves problemas da Guiné há anos.

Leia o relatório em:
http://www.crisisgroup.org/en/regions/africa/west-africa/guinea-bissau/183-beyond-compromises-reform-prospects-in-guinea-bissau.aspx

As propostas de Marcolino Moco para Angola

Marcolino Moco publicou recentemente um ensaio intitulado "Angola- a terceira tentativa". Neste documento ele apresenta propostas para o melhoramento da vida sócio-política de Angola. O ex-primeiro ministro do país, em entrevista a DW, negou que pretende se candidatar as presidenciais deste ano e que o seu nome seja indicado para concorrer como vice-presidente do país pelo MPLA, o partido no poder. Mas se essa posbilidade exisitir, Moco diz que impõe algumas condições para ocupar qualquer cargo dentro do MPLA. Numa entrevista a DW, conduzida por mim, Moco falou sobre o seu país:




Nádia Issufo: Qual é a terceira alternativa que propõe para Angola no seu ensaio?
Marcolino Moco: Para começar eu chamo de primeira alternativa as práticas do regime actual na sua arrogância, o seu descaramento em relação aos desvios de bens públicos para utilização pessoal, na sua ideia de fazer secar a oposição, na sua ideia de centralizar tudo em Luanda e nas mãos do presidente. E chamo segunda alternativa ao que já se começa esboçar e que pode desembocar numa revolução, em que as pessoas, depois de dez anos do fim da guerra, começam a reagir contra esse tipo de reacção. E muitas pessoas já começam a comprar a situação de Angola a da Tunísia, Egipto ou Líbia, em que houve uma revolução, mas que também não resolveu os problemas. Então, é ai que surge a terceira alternativa que é um conjunto de propostas que apresento para se chegar a negociação em que se aborde, por exemplo, a espoliação que teve início no tempo da guerra e não havia controlo, mas que deve parar. A família do presidente que tem as coisas que fique com ela, mas que pare com isso de uma vez por toda e que invista o dinheiro que arrecadou no país e que comece a submeter-se as regras.

NI: No seu ensaio fala da necessidade do abondono de uma concessão pessoalizada do poder para que se passe a uma agenda verdadeiramente nacional. A actual agenda de governação não serve aos interesses nacionais?
MM: Não sou eu que acho... Todo o individuo que vive em Angola e observe minimamente o que se passa, porque está tudo a vista, e não é preciso investigar, sabe. E se as pessoas precisam de investigar é só ler algumas coisas publicadas nos últimos tempos, por exemplo, o livro do jornalista e pesquisador Rafael Marques, que inclusive o entregu a Procuradoria para que processe gente ligada ao poder pelas atrocidades que comete contra a população do Leste de Angola em nome da exploração de diamantes para determonadas famílias, e existem outros exmplos para demonstrar que o Estado está pessoalizado. Tudo o que acontece hoje é igual ou pior do que na era colonial.

NI: Diz que as eleições do tipo ocidental não resolvem questões de fundo e que tem sido a mãe de muitas tragédias, particularmente em África. Quer explicar melhor esse ponto de vista no que concerne ao seu país?
MM: Também está a vista de todos que as pressões que o Ocidente faz para a realização de eleições que nunca resolveram os problemas e nunca resultaram em grandes coisas, temos exemplos do Gabão e do Quénia. Enquanto antes das eleições não se resolvem os problemas fundamentais, as eleições não servem para nada. Eu costumo usar a seguinte parábola: quando você usa perfume no corpo sem primeiro tomar banho, o resultado é um cheiro nauseabundo, e por vezes é o que se faz aqui em África. Nas próximas eleições angolanas ou vai haver a rejeição dos resultados, ou então o regime vai se reforçar ainda mais. E a fraude já começou, porque o único candidato que domina  todos os meios de comunicação públicos é José Eduardo dos Santos, e os meios privados que chegam ao interior do país são dos filhos dele e dos seus próximos e a falta de transparência na utilização dos bens económicos e financeiros é muito descarada.

NI: Fala-se de uma aproximação do presidente José Eduardo dos Santos a outras figuras e partidos em Angola como interpreta esta aproximação?
 MM: Esta aproximação enquadra-se naquilo que eu chamo a solução de primeira alternativa, que é dividir para reinar. Neste momento é claro que com as manifestações dos jovens e com a proximidade de eleições José Eduardo dos Santos está a fazer todos os jogos para dizer que zela pelo diálogo. Mas é um diálogo ínvio porque assenta não no interesse do país mas nos seus próprios interesses.

NI: Vai candidatar-se às presidenciais?
MM: Não, como seria possível? O Presidente mudou as coisas de tal modo que só os partidos têm essa possibilidade ou então as coligações. Eu prefiro continuar como estou a fazer uma intervenção cívica política.

NI: E nem como vice-presidente? Ou seu nome não foi apontado?
MM: Onde? No MPLA? Nem pensar. Eu não estou na direção do partido pelo que não posso ser apontado, nem aceitaria enquanto aqueles pontos que coloquei no meu ensaio não forem publicamente esclarecidos. Qualquer contato comigo só poderá ser feito na base desses dez pontos que cito no meu documento porque Angola tem de começar a respeitar os direitos fundamentais das pessoas. Alias este documento apareceu porque se tem estado a aventar que es estaria a ser sondado para um regresso, isso para alerter que qualquer aproximação a minha pessoa só pode acontecer depois de resolvidos os tais pontos.

Escute parte desta entrevista em: 
http://www.dw-world.de/dw/0,,9585,00.html
Selecione a emissão da manhã do dia 24 de Janeiro de 2012

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

O 5º Poder

São as agências de notação financeira. Nestes tempos de crise elas quase tem o estatuto de Deus nas suas avaliações de excessiva "alfabetização" e simbolos aritméticos sobre as economias das nações, sem contudo as deixar mais "letradas": "Você ai tem CCC, portanto está mesmo grego!" ou raras vezes: "Voçê tem AAA e está bem". Gregos também ficam os jornalistas para não se baralharem com tantos Aas ou Bes, e quando ouvem falar em Standard & Poor´s ou Moody´s já sabem que coisa boa não é.

Está bem, não exagero, as agências de notação financeira são como São Pedro cheio de autoridade a dizer: "Você entra no paraiso, você não entra, você não entra..." Mas quando elas, raramente, "alfabetizam" as chamadas grandes economias (acho que podemos dizer a partir de agora que essa expressão caiu em desuso...), ou países poderosos, ouvimos os seus dirigentes responderem com indiferença: "as agência de notação financeira são livres de fazerem as suas avaliações..." E ai a media "obediente" também colabora e faz o assunto morrer.

Não entendo nada de finanças, mas acho estranho que essas agências tenham tanto poder para derrubar, em dois segundos, países que foram edificados durante séculos a custa de muitos cérebros e muito trabalho. Isso parece-me uma mafia legalizada, ou não?
Será que a corrupção chegou ao céu? Valha-me Deus!

Caso queira saber mais sobre as agências de notação financeira consulte:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u317159.shtml

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

As caras dos aeroportos cabo verdianos

O novo aeroporto da Cidade da Praia em Cabo Verde vai se chamar Nelson Mandela. Segundo o governo local isto é uma homanagem aos 22 anos de libertação do homem que combateu o apartheid e foi presidente da África do Sul. Uma pena que Cabo Verde já não vá a tempo de receber as mesmas honras do regime do Apartheid por ter servido de trânsito para a companhia aérea sul-africana, South Africa Airlines, durante o período em que o actual homenageado estava enclausurado na Ilha de Robben...
Fiquei a saber só agora com o meu colega que para além dos aviões passarem por lá tinham também um hotel onde hospedavam o seu pessoal no Sal. Isso numa altura em que os países africanos, e para todos efeitos Cabo Verde pertence ao continente... , tinham isolado Pretória.

E outra pessoa que não reagiu bem a esta homenagem, não pelos mesmos motivos que eu, foi um ouvinte da Deutsche Welle, a rádio internacional da Alemanha, que disse: "Cabo Verde devia procurar heróis no seu país, se é que os tem." Bem, eu e com a minha mente extrapoladora desconfio que sim, tem heróis na arte de virar casaca, um comportamento característico do mundo político, principalmente o de hoje que é imoral.
Outros abutres que já estão a espera de boca aberta são os jornalistas, como disse o meu colega: "Eles sitiam a casa de Nelson Mandela a espera da sua morte." Muitos destes profissionais algumas vezes extrapolam os limites da decência, e do aceitável. E não há quem os páre, já que estão montados sobre o chamado quarto poder e tem um escudo maior que o sol chamado liberdade de imprensa.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

O carvão da discórdia

Os desalojados da riqueza manifestam-se contra a sua nova condição de pobres em cima de uma gelado silêncio do governo moçambicano e da empresa brasileira Vale.
As minas de carvão de Moatize, exploradas principalmente pela Vale, já entram nas listas que começam a permitir Moçambique brilhar um pouco como fonte de recursos minerais que movem as grandes potências, são consideradas a maiores minas a céu aberto do mundo. Uma mina que veio deixar a céu aberto, mais uma vez, a indecente e desrespeitosa forma como o governo moçambicano trata os seus eleitores. A resposta ao descontentamento das cerca de 700 famílias tem sido a acção da polícia, incluindo a de intervenção rápida, conhecida pela sua violência.

Outro fenómeno interessante é que as tentativas de manifestações dos desalojados são muito pouco divulgados pela imprensa. O que mais se ouve, é sobre os grandes volumes de carvão para a exportação que até a Vale se vê a nora para os tirar do país, sendo até obrigada a negociar com vizinhos indesejados de Moçambique, já que este último não se mostra capaz...

E triste é existir num cenário delicado dois intervenientes com atitude aparantemente arrogante. Será que os investidores da era guebuziana sentem-se contagiados pela táctica do silêncio do presidente?
O que difere estas duas partes dos comerciantes estrangeiros e reis do século XV em África? Trocavam vidros e putras bugigangas por ouro e marfim. Vários séculos depois continuamos na mesma.

Mais sobre o assunto para acompanhar em:
http://www.dw-world.de/dw/article/0,,15659793,00.html

Megaprojectos em Moçambique: Tiram muito e contribuem pouco

Em Moçambique os megaprojectos contribuiem com muito pouco para o país, segundo um relatório sobre as contas do Estado publicado pelo Tribunal Administrativo. Em 2010 os oito megaprojectos contribuiram com apenas 0,004% para as receitas do Estado, o equivalente a 83 milhões de euros, e 0,001 para o Produto Interno Bruto. Consideram-se  megaprojectos as empresas com investimentos acima de 500 milhões de dolares. No país quase todas elas estão isentas de pagamentos de impostos, facto contestado há alguns anos internamente e externamente, mas o governo moçambicano não renegoceia com as grandes empresas os contratos. Será normal que empresas com grandes rendimentos contribuam com tão pouco? O economista moçambicano Lourenço Venissa respondeu a esta e outras perguntas:

Lourenço Venissa: De facto era de se esperar que os megaprojectos tivessem uma contribuição muito acima do que estão a dar actualmente. A explicação para isso tem a ver com a história da instalação dos megaprojectos. Como se sabe logo depois do acordo de paz, em 1992, houve necessidade de atrair investimentos para o país e se criou condições para isso, com leis específicas para atrair projectos dessa dimensão. E houve necessidade de se fazer concessões nessa altura, meados dos anos noventa, mas o contexto hoje é outro, Moçambique hoje está numa melhor posição negocial e por isso seria de todo o interesse mudar esta posição revendo os contratos e curso.

NI: Há tempos que havido pressões internas e externas para que o governo moçambicano renegoceie os megaprojectos que estão isentos de pagamentos de impostos. Entretanto,  nada aconteceu até agora...
LV: Existem duas posições bem claras; os que defendem que não adianta renegociar os projectos porque isso criaria uma imagem negativa do governo, porque se trata de acordos e contratos, e quando estes existem é necessário que haja alguma estabilidade. Então, quando se renegoceia significa que os contratos não são estavéis e põem em causa a credibilidade do governo. Por outro lado, existe outra posição que defende que renegociar é um processo normal em função de novas variáveis. Quando há uma negociação em que todos saem a ganhar, ela perdura sem necessidade de renegociação. Mas quando há uma negociação de curto prazo, em que apenas um lado ganha, então é preciso se renegociar. Estamos a falar de contratos em que os megaprojectos estão a ganhar muito dinheiro, e isso não é segredo para ninguém, as suas contas são auditadas a nível internacional, e o Estado moçambicano está a perder muito dinheiro. Agora, o porque de se manter este contratos, já depende da sensibilidade do governo. Eu penso que a nível do governo existem algumas posições que insistem em não voltar a mesa de negociações.

NI: Muitos desses megaprojectos, que estão isentos de pagamento de impostos, tem por obrigação contribuir para o desenvolvimento das comunidades onde estão inseridos. Mas os bispos católicos pedem a esses megaprojectos mais impactos das suas acções na vida dessas populações. Para si, as acções dessas empresas são suficientes se se comparar com os seus rendimentos e a isenção fiscal?
LV: Claramente que estamos a falar de algumas participações muito pontuais que se enquadram na obrigação social que esses projectos tem, mas isso não tem um grande impacto. Por exemplo, no caso de Tete, onde algumas das concessões mineiras estão a criar problemas na vida das pessoas, a sua contribuição é irrisória. Questiona-se a vários niveis esse tipo de acordos.

NI: Então pode-se dizer que o governo moçambicano ainda não está a saber negociar com megaprojectos vantagens com as populações?
LV: Nesse aspecto sente-se uma ausência da acção do governo e isso tem sido posto em causa, e não se percebe porque. Há também questões políticas, alguns actores políticos consideram que outros políticos, possivelmente, tem alguma participação ou interesses. Então, não se entende muitas vezes o que se está a passar, mas a sua contribuição é irrisória e não tem impacto nenhum na vida da população e não se pode pensar que as soluções de responsabilidade social são suficientes.

domingo, 8 de janeiro de 2012

100 anos do ANC: era uma vez um ideal...

O ANC, Congresso Nacional Africano, celebrou neste domingo o seu centésimo aniversário. Os seus apoiantes, que nao sao poucos, entretanto, terao apenas celebrado uma lenda, uma imagem, ou mesmo as cinzas de um grande ideial. Alguns veteranos deste movimento histórico sul-africano criticam os novos líderes, acusando-os de se preocuparem com o auto-enriquecimento e nao com os ideiais que originaram o ANC, que eram de forma resumida, o bem estar do povo.

Para além disso, a crise em 2011 com Julius Malema, o líder juvenil do ANC, deixou clara a insatisfacao de alguns sul-africanos face a acumulacao de riqueza por parte de alguns governantes. E também evidenciou, mais uma vez, as cisoes dentro do partido, o que fragiliza a sua imagem, pelo menos a actual...
A única coisa que "safou" o ANC, foi o facto de Malema ter agido como arruaceiro, mas que num país como a África do Sul pode ser uma grande passo para conquistar apoiantes insatisfeitos... E acredito que foi por um triz que Malema nao conseguiu mais.

Sair na hora certa
A ser verdade o que dizem os veteranos descontentes, lamento por Nelson Mandela e outros homens de bem do partido, que vem a causa das suas vidas ser "avacalhada" assim. Por outro lado considero que o primeiro presidente do país foi sábio ao abandonar o poder depois do primeiro mandato. Entrou para o poder como herói e saiu de igual forma. É verdade que vários factores terao infuenciado a sua saída de lá, como por exemplo a necessidade de aproveitar os últimos anos da sua vida de forma descansada. Se ele se tivesse mantido colado a cadeira, de certeza que o seu nome estaria tao sujo como está hoje o nome do ANC. A conjuntura do país ditaria isso, tal como a ditou em quase todos os países africanos.
Li num livro o seguinte: "a política sempre foi um jogo sujo, desonesto, etc, mas hoje ela é imoral"

Escute algumas pecas sobre o ANC em:
http://www.dw-world.de/dw/0,,9585,00.html
Selecione as emissoes da manha do dia 5 de Janeiro de 2012, 6 de Janeiro de 2012 - Noite

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Intercalares em Inhamabane: Renamo entrega lugar ao MDM

No primeiro trimeste deste ano devem acontecer eleições intercalares no Município de Inhambane, na província com o mesmo nome, no sul de Moçambique. O escrutínio acontece porque o anterior edil da cidade, Lourenço Macul, faleceu, e a lei eleitoral prevê eleições intercalares até a realização de eleições municipais, já agendadas para 2013. A Frelimo, o partido no poder, que tem fortes apoios nesta região, já garantiu que vai entrar na corrida. A Renamo, o considerado maior partido da oposição, nega-se a participar alegando que as eleições no país não são livres e justas. Já o MDM, a nova força da oposição, considerada a esperança do país, ainda não se decidiu. Será que o MDM, que já conseguiu "roubar" Municípios aos outros dois partidos, vai se empenhar em entrar numa luta dada como vencida pela Frelimo? Luis Nhanchote, editor adjunto do jornal "Canal de Moçambique" responde:


Eu penso que o MDM, que é ainda uma democracia embrionária em Moçambique, tem possibilidades de se apresentar ao eleitorado de Inhambane como uma alternativa política. Mas o histórico da democracia no país, depois da guerra civil, indica que a Frelimo é o provável vencedor, por razões óbvias que a história explica: foi uma das províncias no sul onde os efeitos da guerra civil mais se fizeram sentir. Eu penso que a Renamo está a suicidar-se politicamente porque não está a participar.

Nádia Issufo: O facto da Renamo não participar nas intercalares não abre espaço para o MDM na medida em que participa como único partido da oposição?
LN: Eu penso que a Renamo aos poucos está a entregar o espaço que o determina como maior partido da oposição ao MDM. Este último está a saber tirar proveito sobretudo pela inteligência e a astúcia do seu presidente, Daviz Simango.

NI: Dos 43 municípios do país o MDM já conseguiu dois. 2013 é ano de eleições municipais, qual seria na sua óptica, o município que poderia ser conquistado por este partido?
LN: Eu penso que Nampula, e se o MDM tiver um candidato forte pode concorrer em Maputo, porque os resultados das últimas eleições gerais indicam que o MDM chegou a vencer a Frelimo em circulos onde era impensável ganhar, como na Polana Cimento e Sommershield, em que há um eleitorado urbano que está decepcionado com a Frelimo e o MDM está a saber tirar proveito disso, também pelo que eles apresentam como alternativas. A juventudo e os mais velhos estão a perceber que o MDM pode ser uma alternativa política sobretudo para dar um recado a Frelimo, e o MDM esta a saber tirar partido disso. E há um eleitorado que  está acatar isso, sobretudo o urbano que acredita que a Frelimo tem que ir para a oposição.

NI: Considera que Nampula é a proxima conquista do MDM, mas esta cidade é agora o bastião da Renamo...
LN: Só é reduto da Renamo porque o seu líder vive lá, mas as incongruências discursivas de Afonso Dhlakama começam a indicar que a Renamo está a cometer um suicídio político. Há semanas atrás Dhlakama acabou por ser refém dos seu próprios  guardas, porque ele foi se encontrar com o presidente Armando Guebuza e não deu satisfações aos seus membros, e estes acharam que ele foi fazer um negócio financeiro com Guebuza. E a própria bancada parlamentar da Renamo, que foi reduzindo de ano a ano, praticamente está a deriva, por culpa do seu presidente.

Para escutar a entrevista, selecione a emissão da manhã de 6 de Janeiro de 2012 em:
 http://www.dw-world.de/dw/0,,9585,00.html

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

HRW denuncia violências no Sudão

A Human Rights Watch, HRW, exigiu que as forças de segurança do Sudão parem de usar a violência contra estudantes universitários que se manifestam pacificamente no país e libertem os que estão detidos. Entre meados do ano passado e dezembro último várias detenções arbitrárias foram executadas pela polícia local. Na terça-feira a organização de defesa dos direitos do Homem denunciou ainda outras irregularidades cometidas pelas autoridades sudanesas contra a oposição, descontentes e activistas dos direitos humanos. Entrevistei Jean-Marie Fardeau da HRW sobre a situacao no país, e ele começou por exemplifica algumas irregularidades:

Jean-Marie Fardeau: Em comunicado de imprensa a HRW denunciou a intercepção de mais de 250 estudantes em meio dia em Cartum e outras cidades do país entre Setembro e Dezembro de 2011. Para nós as forças de segurança usaram a força de forma excessiva. Isso provocou feridos e existem ainda pessoas presas em lugares desconhecidos, então isso preocupa-nos. Esperamos que as autoridades sudanesas parem com essa política de repressão contra manifestantes pacificos.

Nádia Issufo: A acção da polícia sudanesa é uma tentativa de abortar qualquer tipo de manifestação, a semelhança do que está a acontecer no mundo árabe, ou é relativa a situação já complicada do país?
JMF: Acho que é algo que tem mais a ver com a situação interna do Sudão: primeiro a situação económica que é muito difícil para a população, em particular para os jovens, existe também uma incerteza política ligada ao contexto do novo Sudão sem o Sudão do Sul, existe também movimentos bem particulares ligados, por exemplo, ao movimento de solidariedade para com uma população do Sudão do Norte que foi expulsa de uma área onde existe uma barragem. São coisas mas internas, mas é claro que são movimentos de expressões democrática que com certeza tem a ver com as manifestações no mundo árabe.

NI: Sob o ponto de vista dos direitos humanos, tem havido abertura por parte do governo de Omar al-Bashir, que tem contra si um mandato de captura do TPI acusado de ter cometido genocídio?
JMF: A atitude do presidente do Sudão foi de abertura durante o referendo sobre a independência do Sudão do Sul. Ele deixou a independência se fazer sob pressão da comunidade internacional, mas agora ele está a tentar retomar o poder, tentado limitar a expressão democrática, não somente em Cartum com os estudantes, mas também com os líderes de partidos políticos que estão presos em lugares desconhecidos, e também em regiões mais afastadas de Cartum, no Cordofão do Sul, na região do Nilo Azul, no Sudão do Sul, onde existem movimentos rebeldes contra o poder central.

NI: A HRW diz também que dois actvistas dos direitos humanos foram detidos foram detidos no Sudão do Norte sem acusação. Face as dificuldades enfrentadas pela ONG que alternativas vos restam?
JMF: As alternativas são limitadas, as repressões contra os defensores dos direitos humanos é muito forte, então é o papel de organizações como a HRW a partir de países estrangeiros podemos fazer pressão a partir da opinião pública e da mídia, e pensamos que esta pressão externa tem influência porque a reputação do Sudão está em jogo.

Para ouvir esta entrevista consulte a seguinte página:
http://www.dw-world.de/dw/0,,9585,00.html
Selecione a emissão da manhã do dia 5 de Janeiro de 2012

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Caso Vale: Moçambique nas mãos do Malawi?

Finalmente o Malawi cedeu e a importante linha férrea do norte de Moçambique vai existir. É que uma parte dessa ferrovia passará por Malawi, país que até a pouco tempo se recusava aceitar a sua contrução. O acordo para a sua edificação foi assinado esta semana entre a empresa brasileira Vale, e o governo malawiano, facto que pode deixar Moçambique nas mãos dos malawianos, segundo Manuel de Araújo, especialista moçambicanos em relações internacionais. Numa entrevista a Deutsche Welle, Araújo falou mais sobre o assunto:

Nádia Issufo: É normal que uma empresa estrangeira, a explorar recursos naturais de Moçambique, assine um acordo relativo a interesses também moçambicanos com outro governo? Ou deveria ter assinado entre dois Estados?
Manuel de Araújo: O direito internacional permite que empresas assinem acordos com Estados. No ponto de vista do interesse nacional de Moçambique devia ter sido o governo a aproveitar o acordo com o governo moçambicano, acordo esse que permite o escoamento de carvão e outros recursos da província de Tete para o porto de Nacala. Mas acho que o governo moçambicano devia ter apostado na criação de uma linha férrea que saisse de Tete para um dos portos da província da Zambézia: Chinde, Quelimane, Pebane ou de Macuzi. Só para lhe dar um exemplo, de Moatize para Nacala são mais de 900 km de linha férrea, mas de Moatize para Macuzi são só cerca de 400 km....


NI: Mas o porto de Nacala é considerado de grande valor pela sua profundidade...
MA: O porto de Nacala, mesmo com a profunidade que tem, não será capaz de exportar todo o carvão, mesmo com o escoamento em paralelo do carvão pelo porto da Beira, estes dois portos não serão suficientes. Portanto, é inevitável a construção de uma linha férrea que saia de Tete para um dos portos da Zambézia. Mas o que achamos estranho é a falta de estratégia do governo moçambicano deixando que sejam multinacionais a assinarem acordos com outros Estados, que tem a vaerf c o escoamento das nossas riquezas.

NI: Quais serias as possiveis implicações deste tipo de acordo?
MA: As implicações são várias, a primeira é que 36 anos depois da nossa independência, continuamos a  insisitir numa estratégia de desenvolvimento que, privilegia os interesses das empresas multinacionais em vez dos interesses do povo moçambicano. Poratanto, o governo tem a obrigação de desenvolver estrategia que defendam os interesses de Moçambique e as multinacionais debem estar subordinadas aos interesses estratégicos de desenvolvimento de Moçambique. Uma das conseuências é a perda de um quinhão da soberania nacional. No dia em que o Malawi entender, por algum jogo de interesses, pode suspender a passagem do carvão por seu território, o que pode resultar em custos elevadíssimos para Moçambique e para a sua soberania."

NI: Existe uma crispação entre Moçambique e o Malawi. Neste contexto como vê o actual acordo?
MA: É  mais uma bofetada que a diplomacai guebuziana leva, depois da bofetafa que o governo de Gubuza deu a Bingo Wa Mutarika ao prender a barcaça que tentava provar a navegabilidade do rio Zambeze. De lembrar que o Malawi construiu um porto em Nssange, no Malawi, que tinha como objectivo fundamental a importação e exportação de produtos, utilizando Chire e o rio Zambeze, em território moçambicano, e o governo de Guebuza não aceitou. Penso que de alguma forma a empres barsileira Vale e o Malawi acabaram por devolver a bofetada a Guebuza.