segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

O lado da capulana que muitos não vem


Foto: Ismael Miquidade
Titulo: Pano para toda obra

É esse que vos trago hoje. Não o lado do avesso não, é o lado certo que nos cobre todos os dias, mas que ninguém quer ver ou se lembrar, trago principalmente aqui o lado da dor e negro, embrulhado por este indispensável pano.

A última acompanhante
"Quando eu morrer quero que usem estas capulanas aqui para me enterrar. Vão continuar guardadas aqui na mala." Quantas moçambicanas já ouviram este recado dos seus parentes amados mais velhos? Quantos não são obrigados a engolir as palavras de recusa da morte dos seus amados enquanto estes últimos escolhem tranquilos as capulanas que marcaram momentos das suas vidas? Aqueles momentos que muito gostamos de lembrar e escrever, como o casamento, o xiguiane, em que a noiva recebe como presente especial a capulana, ou então quando se vai embora para a casa do marido as mulheres da sua família e amigas cantam de alegria embrulhadas em lindas capulanas? Portanto, existe o fim da linha que é embrulhado com a capulana do percurso

Viúva negra
Três vezes, pelo luto que tem de usar pela morte do esposo, pela cor da pele (na maior parte dos casos negra), e pelas capulanas que os seus usam para as cobrir. Tão mortas quanto o seu luto e o seu homem, tão sem vida, tão pesadas. Essas são as capulanas da viúva, aquela que olhamos a primeira e sabemos quem é, pelo que traja, mas nunca ousamos comentar. Essa é a capulana que quase leva a mulher para junto do seu marido.
E ainda me resta a possibilidade de fazer uma analogia a viúva negra, a aranha que depois da cópula costuma comer o macho. A viúva da região sul de Moçambique, algumas ainda, tem, por tradição, em sociedades patrilineares, manter relações sexuais com o irmão do seu falecido marido, o Kutxinga. Ou seja, ela é "comida", mas não tem poder para "comer" o cunhado.

As cores que (não) enfeitiçam os machos
O que faz uma mulher do norte ser uma "muthiana horera" (mulher bonita)?, deve haver muitas coisas, muitos segredos valiosos que desconheço, mas as suas capulanas garridas deixam-nas, com certeza, mais bonitas. Sabemos imediatamente distunguir as capulanas usadas pelas mulheres do norte, muita cor, alegria, tudo que atrai olhares de apreciação. E como são as capulanas do sul? São também lindas, com padrões bem definidos, fortes nas suas cores geralmente com tendência para o escuro, não são arrojadas, petulantes, não afrontam...
Quem vive em Moçambique sabe bem do que falo, e quem também já leu "Niketche" de Paulina Chiziane sabe do que falo... "ninguém domina tão bem os homens como estas sereias de cores garridas"

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