terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Olhando de longe e fazendo muitas perguntas...

 Foto: Sérgio Manjate

Por acaso no dia em que chegou a Maputo o corpo de Malangatana conversei com um colega. Ele reclamava que estava cansado e eu perguntei porque, ele explicou-me que era por causa mesmo das cerimónias funebres do artista plástico. Não estando lá e tendo acesso as informações apenas por internet, limitei-me a fazer muitas perguntas para saber como a media local estava afazer a cobertura...
Colega: chegou o corpo de Malangatana hoje e estamos a fazer um directo
Eu: Ai é? Ele morreu???
Colega: Sim, não sabias???
Eu: Claro que sabia... mas achas que a chegada do corpo merece um directo?
Colega: Todos os canais estão fazer...
Eu: É só porque os outros fazem que o vosso canal também faz?
Colega: Até em Portugal fizeram...
Eu: ...
Colega: Estiveram no aeroporto muitos dirigentes
Eu: E o que vocês estão a fazer com os dirigentes lá?
Colega: Fazemos entrevistas sobre o Malangatana...
Eu: Vocês já fizeram uma reportagem  ou um documentário desde que ele morreu com depoimentos de pessoas próximas a ele, momentos marcantes da vida dele, entrevistas com ele, etc?
Colega: Temos estado a falar sobre ele sempre, trazemos convidados para o estudio, etc

 E falamos mais um pouco e a conversa acabou. Por outro motivo tive de falar com outro colega e não perdi a oportunidade de continuar a fazer perguntas sobre o assunto. Resumo a conversa com o colega dois também:

Eu: O que achas dos directos que estão a fazer por causa da chegada do corpo de Malangatana?
Colega dois: Estão a ser bons, desde cedo que os canais estão a transmitir e muita gente está a acompanhar.
Eu: Não achas que um documentário sobre o trabalho dele e o seu legado e momentos da vida dele seria o mais indicado neste momento?
Colega dois: Nádia... cada canal está a dar o seu contributo...

A conversa terminou pouco depois. Vejo as notícias nos sites moçambicanos. As fotos no aeroporto são de dirigentes alinhados e todos direitinhos e militares a carregarem o caixão. Um dia depois vejo na galeria de fotos de grandes acontecimentos de um jornal electrónico o velório de Malangatana no Munícipio de Maputo, as figuras da política moçambicana em peso estavam na maioria das fotos, lá de quando em vez aperecia um artista ou algum familiar ou ainda anónimos. A última foto que vi, numa notícia,  foi a do presidente Guebuza e a sua esposa próximos do caixão.
Não questiono, nunca, a figura de Malangatana. Ele é uma referência incontornável das artes plásticas moçambicanas, e também da  história do país. Concordo e aprecio a homenagem e o espaço de antena concedida a esta figura. Agora só me pergunto se tudo isso não poderia ter sido feito no sentido mais correcto, ou seja, explorando principalmente a figura dele. O que percebo, é verdade que estou longe, são fundamentalmente duas coisas: que altas figuras políticas do partido no poder promovem, em excesso, as suas imagens, com a ajuda intencional ou não da media..., e a media local por sua vez se bate para poder dizer que transmitiu em primeira mão um grande acontecimento. E porque não páro de fazer perguntas, fica aqui a última: e o grande objectivo, que é o artista e o seu legado, onde fica? A tentar sobressair no meio de políticos e da media alucinada?

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